Automedicação: Farmacêutico, a culpa não é sua, entenda por que

Automedicação: Farmacêutico, a culpa não é sua, entenda porque

Desde 2014 tenho realizado pesquisas acerca do comportamento brasileiro, relacionado ao consumo de medicamentos por conta própria. Os estudos - que considero pioneiros – trouxeram luz, para mim, sobre um tema que antes era baseado em ‘achismos’, mitos e nenhuma estatística científica.

No primeiro ano de estudo, 2014, constatamos que 76% da população declaravam se automedicar sem qualquer reserva. Em 2016, o índice variou para 72%. Já em 2018 cresceu para 79%, e agora, em 2020, observamos que 81% dos brasileiros indicam consumir medicamentos por conta própria.

Um estudo semelhante, encomendado pelo Conselho Federal de Farmácia (CFF) ao Datafolha, em 2019, constatou os mesmos índices, validando a informação que há seis anos estamos construíndo e entregando à sociedade por meio da imprensa. Na pesquisa da entidade 77% dos brasileiros se automedicam.

Diante dos dados e estatísticas é imperativo nos questionarmos: afinal, o que, é de fato, a automedicação? Bem... o Ministério da Saúde (MS), em sua biblioteca virtual de saúde, define que automedicação é o ato de tomar remédios por conta própria, sem orientação médica e ponto. No entanto, eu tenho três considerações antes de pensar em uma definição sobre o que é automedicação.

PRIMEIRA: É preciso diferenciar remédio de medicamento. Quem toma remédio como cita o MS, pode até estar se auto remediando, mas se automedicando, não! O medicamento é todo e qualquer produto, com segurança e eficácia comprovadas, que tem a finalidade de prevenir, diagnosticar, tratar, aliviar sintomas e curar. A vacina, o antibiótico e até um Medicamento Isento de Prescrição (MIP) são exemplos de medicamentos - desses produtos você sabe o que esperar em termos de funções terapêuticas.

Já o remédio, citado na definição do MS, como o próprio termo já diz, tem a função de remediar um estado de saúde, com alívio temporário e muitas vezes até puramente psicológico, sem qualquer comprovação científica. As práticas integrativas de saúde, como aromaterapia, massagem e aculpultura, são exemplos de remédios que funcionam para o bem-estar das pessoas, mas que não podem prevenir, diagnosticar, tratar ou curar.

Resumindo: todo medicamento é um remédio, mas nem todo remédio é um medicamento. Não podemos chamar de automedicação o autoconsumo de remédios, como um chá, diluições empíricas ou ainda uma massagem feita sem a indicação, prescrição e orientação de um profissional de saúde.

SEGUNDA: no Brasil existe uma falácia, amplamente difundida na mídia, de que a consulta e prescrição médica são obrigatórias se você não quer se automedicar. E isso é uma fake news! O profissional de saúde que mais conhece de medicamentos, desde a pesquisa clínica (desenvolvimento) até as reações adversas observadas no pós-consumo (farmacovigilância), é o farmacêutico - e esse profissional pode ser acessado em qualquer horário de funcionamento das farmácias que não são clandestinas.

A atenção farmacêutica e a orientação de qualquer profissional de saúde - como enfermeiros, odontólogos, psicólogos, fisioterapeutas, dentre outros - podem subsidiar o paciente sobre como usar, de forma racional, qualquer medicamento. Isso é obvio!

O médico pode até ser soberano em alguns tipos de prescrições. Mas não é autoridade na orientação sobre Uso Racional de Medicamentos (URM). Ele é dispensável? Nunca! Mas a verdade é que médicos, em boa parte, não explicam nada sobre medicamentos que prescrevem para os seus pacientes.

Pessoalmente, defendo que a automedicação está principalmente ligada à falta de orientação sobre o uso de produtos farmacêuticos. É fato que, em muitas situações, a prescrição médica é apenas uma burocracia desnecessária.

TERCEIRA: Muito se fala, e inclusive eu acreditei por muito tempo, que a automedicação no Brasil é apenas cultural. Pode até ser, em parte. Afinal, como diz o ditado: de médico e louco todos nós temos um pouco. Mas a automedicação não é só uma cultura. É também o resultado de como o nosso sistema de saúde se organiza e controla a comercialização de medicamentos. E, para ser mais direto: o sistema de controle da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é o grande responsável.

Há alguns anos, o autoconsumo de antibióticos - que causam resistência bacteriana - era alarmante no Brasil. Para barrar o consumo desenfreado e puramente comercial, a Anvisa estabeleceu sistema de controle e retenção de receitas, conforme estabelecido na RDC n° 20/2011. O fato é que hoje, no País, apenas 11% declaram consumir antibióticos sem prescrição e orientação médica. Quer uma outra constatação de que o controle funciona? Apenas 4% da população declaram consumir ansiolíticos, tarja preta, por conta própria.

O mesmo não poderia ocorrer com as demais classes de medicamentos? Vejamos: 40% dos brasileiros consomem de forma desordenada antigripais e analgésicos. 30% consomem por conta própria e do jeito que acham correto antialérgicos, anti-inflamatórios e antitérmicos. Todos esses medicamentos, se consumidos de forma irracional, podem trazer danos à saúde e até risco de morte. Por que não se controla a venda desses medicamentos por meio da prescrição e orientação farmacêutica, documentada e registrada junto ao órgão sanitário?

Não podemos reclamar. Os índices de automedicação vão continuar crescendo nos próximos anos, não por falta de farmacêuticos ou médicos, mas porque o nosso sistema de saúde (Anvisa) decide não controlar a venda desses produtos. E, claro, também porque a população escolhe (de forma cultural) não receber orientação do farmacêutico sobre o medicamento que está pegando na gôndola de acesso livre da farmácia.

Recentemente, li no aclamado jornal de economia, O Valor, uma entrevista do presidente da Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (Abrafarma), Sergio Mena Barreto, que dizia: “As vendas de medicamentos isentos de prescrição médica subiram quase 21% [até novembro de 2019]. É uma taxa alta, que não se viu nos anos anteriores, um sinal de que aqueles que ficaram sem plano de saúde porque perderam seus empregos devem ter buscado a automedicação, elevando a venda”... Quando li essa afirmação pensei: por que o consumo de MIPs, que está crescendo, seria simplesmente classificado e considerado automedicação? Não teríamos farmacêuticos nessas farmácias? Esses farmacêuticos não poderiam ser agentes de mudança nesse cenário? Foi então que me lembrei da cultura médico-centrada, pregada pelo Ministério da Saúde, que diz: “automedicação é o ato de tomar remédios por conta própria, sem orientação médica”.

Em suma, precisamos reconsiderar o que é automedicação e não nos culparmos tanto por sua existência. Em minha opinião, automedicação é a decisão de um paciente em tomar medicamentos sem orientação, prescrição e acompanhamento de um profissional de saúde habilitado para o tratamento em questão.

*Marcus Vinicius Andrade é administrador de empresas, fundador do ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico e acadêmico de Farmácia.

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