Redes proíbem uso de EPI para não assustar clientes

Redes proíbem uso de EPI para não assustar clientes

Após um artigo de opinião ter sido publicado no portal de conteúdo do ICTQ, centenas de farmacêuticos começaram a se manifestar, por meio das redes sociais e também por mensagens privadas, dando depoimentos, principalmente, com relação à falta de equipamentos de proteção individual (EPI) nos estabelecimentos onde trabalham. A maioria afirma que as farmácias impedem o uso de máscaras para não assustar os clientes.

O artigo é intitulado Coronavírus: Farmacêuticos devem receber por insalubridade e trabalhar com EPI e defende que os farmacêuticos fazem parte de um grupo de risco de contato e contágio pelo coronavírus (Covid-19). Dentre todos os profissionais de saúde, incluindo enfermeiros e médicos, são os farmacêuticos, os mais expostos nas mais de 80 mil farmácias e drogarias distribuídas em todo o País.

Uma importante pergunta é levantada no artigo: os equipamentos de proteção individual estão sendo disponibilizados pelas farmácias e drogarias aos seus profissionais?

A resposta dos farmacêuticos chegou também por meio digital e a grande maioria denunciava que as farmácias não ofereciam EPIs para os profissionais que faziam o atendimento farmacêutico.

Leia o artigo: Coronavírus: farmacêuticos devem receber por insalubridade e trabalhar com EPI

Por outro lado, o Ministério da Saúde (MS), por meio do sistema público de saúde (SUS), está recrutando todos os profissionais para o combate à transmissão do novo coronavírus (Covid-19). O ministro, Luiz Henrique Mandetta, da Saúde, disse, na última terça-feira (17/03), que irá acionar as farmácias brasileiras, e seus farmacêuticos, para que também estejam na linha de frente nessa luta. Assim, elas deverão fazer parceria com o Governo para aplicar vacina contra a gripe, fazer os testes para a detecção do novo coronavírus, a notificação dos casos suspeitos e confirmados, além da assistência farmacêutica.

Adicionado a isso, o governador de São Paulo, João Dória, anunciou, na manhã de ontem (18/03), que mil drogarias ligadas à Associação Brasileira Redes Farmácias e Drogaria (Abrafarma) vão participar, oficialmente, da campanha de vacinação no Estado. A parceria será firmada também para a entrega de medicamentos em domicílio. Assim, o que se ventila entre os profissionais é que, estando na linha de frente, os farmacêuticos ficarão mais expostos à contaminação pelo coronavírus.

Leia também: Coronavírus: farmacêutico clínico é a nova estratégia do SUS

Manifestações dos farmacêuticos

O que pôde ser lido em quase 200 comentários computados apenas em postagem referentes ao tema da falta de disponibilização de EPIs pelas farmácias aos seus colaboradores, no Facebook e no Instagram, foi quase unânime: as empresas não estão fornecendo EPI para o atendimento dos farmacêuticos, seja pela falta deles no mercado, seja pelo alto custo ou pelo fato de que os proprietários entendem que os clientes ficarão assustados com a cena.

Entre os comentários, foram citadas algumas redes, como Pague Menos, Drogasil e Drogaria São Paulo, como locais em que os EPIs não estão disponíveis aos farmacêuticos. Os nomes dessas pessoas são preservados a pedido delas. Há, inclusive, uma gestante, que trabalha em uma pequena rede com seis unidades, que confidenciou ter adiantado sua licença-maternidade por medo de estar na farmácia sem a devida proteção. Outra farmacêutica, de Manaus (AM), contou que a Pague Menos em sua cidade não fornece máscaras e nem permite seu uso. Inclusive o álcool gel fornecido é apenas para os clientes, e não para os farmacêuticos.

Tayane Duarte afirmou a farmácia onde ela trabalha não vai se opor a quem quiser comprar e usar os próprios EPIs, mas que a OMS diz que não são necessários! Aureliana Souza afirma que seus empregadores não querem que os farmacêuticos usem máscaras para não assustar os clientes.

Martins Marcelo mencionou que sua chefia o acusava de ser o único a pedir EPI para trabalhar, e que não iria comprar porque esses equipamentos estavam caros e que iriam causar pânico nos clientes.

Hellen Luana Lelli comentou nas redes sociais do ICTQ que nas farmácias do SUS a ordem é utilizar [EPI], até porque atende muitos pacientes por dia. ”Essa é a diferença entre o bem-estar colocado acima de interesses mercantis!”

Já Cleiton Brito disse: “Sou farmacêutico e proprietário...Farmácia em Croatá (interior do Ceará).... Há suspeitos pipocando nas cidades do entorno.... Aqui todos dos funcionários com máscaras, álcool gel sempre a mão e ordem de usar álcool gel antes e depois de cada atendimento e lavar as mãos o máximo de vezes possível”.

Flávia Machado disse: “Eu penso assim, muitos em quarentena em casa, e os trabalhadores da saúde em linha de frente? Uma falta de respeito conosco... merecemos usar os EPIs também! Temos família. Não que vamos pegar o vírus, mas é uma proteção! Me pergunto quem é por nós. Apenas Deus. Porque ninguém está nem aí, acha que não vai acontecer... cadê as organizações para protestar em favor da classe da saúde? Não estou com medo, só precisamos de prevenção mesmo! Podemos levar para nossa casa e até mesmo para os nossos clientes/pacientes”.

Diego Paiva afirma que em nenhuma farmácia de nenhuma rede no Rio de Janeiro está usando máscaras, e nem pode, justamente, para não assustar os clientes. “Aí eu pergunto, como em um estabelecimento de saúde (por mais que seja comércio também, é um estabelecimento de saúde), não se usa EPI em uma pandemia?”.

Frente às constantes reclamações dos farmacêuticos paraenses, o presidente do Conselho Regional do Pará (CRF-PA), Daniel Jackson Pinheiro Costa, enviou Ofício aos proprietários de farmácia solicitando o fornecimento, aos farmacêuticos que estão na linha de frente, de todo o material necessário para sua segurança, como máscaras N95 e álcool gel, a fim de promover segurança para os profissionais e para a população.

Além isso, o presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar), Ronald Ferreira dos Santos, afirmou que já notificou as principais redes de farmácia do País, entre 17 e 18 de março, para que cumpram as normas de segurança com relação aos EPIs aos seus funcionários. “Como não obtivemos resposta, estaremos peticionando o Ministério Público para que tome as devidas providências, ainda nesta quinta-feira (19/03)”, garantiu ele.

Há quem esteja contra a medida

Marcelo Nogueira foi contra a argumentação da maioria dos colegas. Ele afirmou: “Entendo... mas o uso da máscara, ao menos em centros cirúrgicos, é para proteger o paciente, e não para proteger os médicos... só se houver algum balconista ou farmacêutico que apresente risco ao paciente... Será que as pessoas que compõe a mesa estão infectadas?”.

Fábio Costa comentou: “Não entendo porque o ICTQ quer sempre alfinetar os proprietários de farmácia. Talvez vocês estejam mirando as grandes redes, mas lembrem-se de que há muitos proprietários de pequenas drogarias que são farmacêuticos. Máscaras? Em falta nos fornecedores, e os preços estão estratosféricos. Além disso, a recomendação de uso é para quem está contaminado. Periculosidade? Gostaria de pagar melhor aos meus farmacêuticos, mas o Governo é o grande vilão e toma boa parte do lucro das drogarias. Melhorem a mira de vocês. Sou farmacêutico, aluno do ICTQ e proprietário de drogaria. Parem de jogar os farmacêuticos contra os proprietários!”.

Jonatha Elias Ramos mencionou que é muita covardia com o empresário (referindo-se ao conteúdo do artigo citado): "Que canalhice se aproveitar deste momento! Vocês devem se esquecer de que a maioria das farmácias fatura menos de R$ 60 mil ao mês”.

O coordenador do Departamento de Assuntos Regulatórios do Sincofarma, Juan Carlos Becerra Ligos, sobre a queixa dos farmacêuticos da falta de disponibilização de EPIs, afirma que nenhum empresário quer que seus funcionários fiquem doentes, porque isso acarretaria falta de material humano, avaliando até pelo princípio comercial. “Isso não tem fundamento. O empresário tem família e presa pela vida, antes de tudo. Claro que há casos fora da curva em todas as áreas, mas isso não é uma regra. Nós estamos estimulando, em determinados casos e situações, que esses equipamentos de proteção individual sejam disponibilizados nas farmácias, no entanto, é necessário verificar até que ponto isso é preciso ou não”.

Ele defende que, às vezes, a máscara cirúrgica e as luvas dão até uma falsa impressão de proteção, e a pessoa não se cuida devidamente. Ele concorda que há a necessidade desses EPIs, por exemplo, na sala de serviços farmacêuticos, onde esses equipamentos são fundamentais. “No balcão, nós estamos pedindo que o farmacêutico permaneça a um metro de distância dos clientes”, afirma Ligos.

Segundo ele, outro problema é que também esses equipamentos de proteção não estão sendo encontrados no mercado, como máscaras e álcool gel, por exemplo. A obrigação seria de o Governo ter previsto isso. Ele afirma que a falta de planejamento do Governo é que está causando sérios problemas nessa pandemia.

Sobre uso de máscaras no balcão assustar o cliente, ele acha que é desinformação, na verdade, a máscara é uma proteção para as pessoas doentes. “Não é que as máscaras não devam ser usadas, é que devemos usá-las da forma correta”, diz.

Leia também: Máscaras acabam em farmácias, mas não protegem - entenda por que

Legislação sobre o uso deEPIs

A Resolução (RDC) 44, de 17 de agosto de 2009, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em seu Art. 18º, afirma que, para assegurar a proteção do funcionário, do usuário e do produto contra contaminação ou danos à saúde, devem ser disponibilizados aos funcionários envolvidos na prestação de serviços farmacêuticos equipamentos de proteção individual (EPIs).

A Portaria MTb 3.214, de 08 de junho de 1978, publicou a Norma Regulamentadora NR 6 - Equipamento de Proteção Individual – EPI, no item 6.3, que diz que a empresa é obrigada a fornecer aos empregados, gratuitamente, EPI adequado ao risco, em perfeito estado de conservação e funcionamento, nas seguintes circunstâncias:

  1. a) sempre que as medidas de ordem geral não ofereçam completa proteção contra os riscos de acidentes do trabalho ou de doenças profissionais e do trabalho;
  2. b) enquanto as medidas de proteção coletiva estiverem sendo implantadas; e
  3. c) para atender a situações de emergência.

O Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP), o Sindicato dos Farmacêuticos do Estado de São Paulo (Sinfar-SP) e o Sindicato do Comércio Varejista de Produtos Farmacêuticos do Estado de São Paulo (Sincofarma) publicaram nota conjunta com diretrizes para conter a propagação do coronavírus, com fundamento no artigo 11, parágrafo único da Lei 13.021/14.  Entre as diretrizes elencadas estão:

- Salas de serviços farmacêuticos: verificar a possibilidade da suspensão de alguns serviços não essenciais, os que podem ser executados em ambiente ventilados. Normalmente essas salas são pequenas, por vezes, com ventilação precária. Assim, o uso de equipamentos de proteção individual neste ambiente é fundamental para a proteção do profissional e cliente;

- Uso de mascara cirúrgica descartável, luvas descartáveis, além de óculos de proteção, se for o caso;

- Termômetros, estetoscópios, glicosímetros, aparelho de pressão, entre outros utilizados pelo farmacêutico, devem ser limpos e desinfetados com álcool líquido 70% após cada uso ou imediatamente caso haja suspeita de contaminação;

- É recomendável ao farmacêutico e à sua equipe utilizar máscaras em todos os atendimentos, considerando que essa situação excepcional demandará este Equipamento de Proteção Individual (EPI);

- O farmacêutico deverá estipular uma faixa de segurança de um metro para o atendimento dos pacientes, a fim de garantir proteção a si e à sua equipe;

- As farmácias deverão disponibilizar álcool gel aos farmacêuticos e aos membros de sua equipe e clientes; e

- quando necessário ao atendimento, é recomendável às farmácias disponibilizarem luvas descartáveis e marcaras cirúrgicas, tanto ao farmacêutico, como para a sua equipe.

Insalubridade a farmacêuticos?

O artigo citado no início desta matéria também defendeu o direito do farmacêutico ao adicional insalubridade. Importante lembrar que a CLT, em seus Arts. 189 a 194, diz que serão consideradas atividades ou operações insalubres aquelas que exponham os empregados a agentes nocivos à saúde. O exercício de trabalho em condições insalubres assegura o ganho de adicional de 40% no grau máximo, 20% no grau médio e 10% no grau mínimo, sobre o salário mínimo da região. A Norma Regulamentadora (NR 15) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), em seu Anexo XIV, preconiza que terá direito ao adicional o empregado que se enquadrar na relação das atividades que envolvem agentes biológicos, cuja insalubridade é caracterizada pela avaliação qualitativa.

Isso significa que a insalubridade de grau máximo é o trabalho em contato permanente com pacientes em isolamento por doenças infectocontagiosas, bem como objetos de seu uso não previamente esterilizados. Já a insalubridade de grau médio é para os trabalhos que ocorrem em contato permanente com pacientes ou material infecto contagiante, em hospitais, serviços de emergência, enfermarias, ambulatórios, postos de vacinação e outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde humana (aplica-se unicamente ao pessoal que tenha contato com os pacientes, bem como aos que manuseiam objetos de uso desses pacientes).

Já a NR 32 reforça o tema. Ela tem por finalidade estabelecer as diretrizes básicas para a implementação de medidas de proteção à segurança e à saúde dos trabalhadores dos serviços de saúde, bem como daqueles que exercem atividades de promoção e assistência à saúde em geral.

O farmacêutico e ex-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Dirceu Raposo, mencionou em sua rede social que durante muito tempo discutiu-se e foi negado, inclusive na justiça, o direito à insalubridade para os farmacêuticos que trabalham em farmácias, com e sem manipulação. “Nestes tempos, os meritíssimos juízes e os sindicatos patronais precisam de mais provas de que o trabalho desses profissionais de saúde é de risco extremo? Cobrem dos sindicatos e associações que nos representam a imediata reivindicação por voto direto pela insalubridade já!”, preconiza.

Precedentes

O que se sabe é que, ao menos, dois casos de farmacêuticos que requereram o direito à insalubridade na justiça tiveram sucesso. A rotina de aplicar injeções no trabalho como farmacêutico gerou direito de receber adicional de insalubridade. Com este entendimento, a Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Goiás (TRT-18) decidiu manter a condenação de uma farmácia a pagar a parcela para um farmacêutico, por causa da aplicação de injeções de forma rotineira. O julgamento mantém sentença da 17ª Vara do Trabalho de Goiânia.

O farmacêutico alegou na ação que ficava exposto a agentes biológicos por ter que rotineiramente aplicar injeções. Na perícia, ficou constatado que ele realizava testes de glicemia por meio de coleta de sangue e aplicava medicamentos injetáveis com o uso de seringas, expondo-se assim a risco de doenças ocupacionais.

A juíza do Trabalho, Ana Lúcia de Faria, deferiu a parcela. A farmácia não produziu nenhuma prova sobre o fornecimento de equipamentos de proteção individual ao farmacêutico. Para ela, a ausência dessa prova foi decisiva na conclusão pericial para o reconhecimento de trabalho em condições insalubres, e da quantidade de aplicações de injetáveis feitas por dia na farmácia.

A relatora do caso, Silene Coelho, destacou, ainda, que a SDI-1 do TST já firmou o entendimento de que é devido pagamento de adicional de insalubridade em grau médio ao empregado de farmácia ou drogaria que faz aplicação de injetáveis em clientes, na forma do Anexo XIV da NR 15, da Portaria 3.214/78, pois o estabelecimento se enquadra no conceito de “estabelecimento destinado ao cuidado com a saúde humana”.

Em outro caso, a juíza do Trabalho, Ana Letícia Moreira Rick, da Vara do Trabalho de Palhoça-SC, condenou uma rede de farmácias a pagar a um farmacêutico o adicional de insalubridade em grau máximo sobre a remuneração do profissional. A sentença foi concedida em primeiro grau e ainda cabe recurso, mas representa uma esperança para os profissionais que reclamam o benefício. A assessoria jurídica do SindFar, que representa o profissional na causa, lutará pela manutenção do parecer.

Assim, a juíza concluiu: “O reclamante estava sujeito ao contágio por agentes biológicos, por diversas formas que não apenas pelas mãos, podendo se dar pela pele, nariz, ouvido, garganta, dentre outros. Assim, o fornecimento de luvas não é suficiente para elidir a insalubridade. Mesmo que o contato do autor com os clientes tenha se dado por tempo curto, o contato com agentes biológicos ocorria, estando ele em constante risco de transmissão. Desta forma, o reclamante tem direito ao adicional de insalubridade em grau máximo”.

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